quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O USO DE ESCALA DE PERCEPÇÃO DE ESFORÇO E RECUPERAÇÃO NO CONTROLE DA CARGA DE TREINO

Este post tem como objetivo explorar métodos de controle da carga de treino mediante utilização de escalas de percepção subjetiva de esforço e recuperação.

Controle da Carga de Treinamento
Para que haja um balanço entre períodos de intensidade alta seguidos de períodos de recuperação, garantindo assim adaptações positivas e melhoras no desempenho, é necessário que haja um controle da carga de treinamento. A percepção subjetiva de esforço (PSE) mostrou ser um método prático e útil para monitorar as intensidades das cargas de treinamento a cada sessão. A PSE consiste no registro da resposta subjetiva de cada indivíduo através de uma escala de intensidade de esforço (CR-10), a uma pergunta sobre como foi intensidade da sessão de treinamento(1). Este método aliado ao tempo de duração da sessão de treino é utilizado para quantificação da carga interna global do indivíduo e tem sido proposto por vários autores, como uma boa alternativa para quantificação das cargas de treinamento no futebol(2, 3). E, além do mais, possui algumas vantagens como: baixo custo, não invasivo, fácil compreensão por parte dos atletas, tem boa correlação com métodos mais sofisticados e pode ser utilizado em diferentes sessões de treino e jogo. Alexiou e Coutts(4) mostraram que a PSE mostrou-se um bom método para o controle da carga interna de treinamento em diferentes tipos de treinamentos (velocidade, força, resistência, técnico) e no jogo, comparado a métodos baseados no controle da carga através da freqüência cardíaca (FC).

Controle da Recuperação do Treinamento
A recuperação dos atletas para um mesmo estímulo de treinamento é diferente. São inúmeros os fatores que influenciam a qualidade da recuperação do atleta para a sessão de treinamento seguinte, dentre eles: alimentação, sono, sistema imune, etc. Alguns marcadores (hematológicos, salivares, fisiológicos e urinários) respondem às magnitudes de carga do treinamento. No entanto, grande parte destes marcadores possuem um custo financeiro e operacional elevado e muitas vezes as respostas não são imediatas, por necessidade de passar por análises apuradas, como é o caso de exames bioquímicos ou fisiológicos (variabilidade da frequência cardíaca). Sem contar também que quando o número de atletas é elevado, dificulta a análise dos dados e sua utilização prontamente.
Pensando nisso, elaborei uma escala de Percepção Subjetiva de Recuperação (PSR), que permite ao atleta descrever como percebe sua recuperação em relação a sessão de treino anterior, após passar por um período de descanso. Vale salientar que esta escala está em processo de validação e, portanto, pode sofrer modificações. No entanto, foi utilizada com grande êxito para fins práticos.

Aplicação das escalas
PSE


Após 20 a 30 minutos do término da sessão de treinamento, a escala deve ser apresentada a cada atleta, que responderá a uma pergunta: “Como foi a intensidade da sessão de treino pra você hoje?” O avaliador deverá instruir o avaliado a escolher um descritor e depois um número de 0 a 10. Para maior confiabilidade dos dados coletados, os avaliados devem ser familiarizados com o instrumento. Esse processo deve durar entre 4 a 12 semanas, dependendo da compreensão dos sujeitos.Essa escala pode ser respondida também pelos membros da comissão técnica, com relação a intensidade que eles creem que os atletas atingiram durante a sessão de treino. Isso pode ser utilizado para confrontar a carga prescrita (externa) pela comissão técnica, com a carga percebida pelos atletas (interna).
O valor referente a escala de PSE deve ser multiplicado pela duração total da sessão de treinamento em minutos, como citado por Foster et al.(1). O valor encontrado, em unidades arbitrárias, é chamado de TRIMP (Training Impulse), um indicador de carga global de treinamento. Posteriormente, pode ser calculado outros índices de quantificação de carga, como: TRIMP dos micro e mesociclos, strain e monotonia; que serão discutidos em posts futuros.

PSR


Ao início de cada sessão de treino, antes de qualquer atividade, a escala deve ser apresentada a cada atleta, que responderá a uma pergunta: “Como está sua recuperação hoje?”. Deve salientar que a recuperação é referente a sessão de treino anterior e que aspectos como dor muscular tardia e alterações do humor devem ser levados em consideração. O avaliador deverá instruir o avaliado a escolher um descritor e depois um número de 0 a 10. Para maior confiabilidade dos dados coletados, os avaliados devem ser familiarizados com o instrumento. Esse processo também deve durar entre 4 a 12 semanas, dependendo da compreensão dos sujeitos.

Resultados Obtidos
Segue o exemplo de dois microciclos de treinamento no qual foi controlada a carga e a recuperação do treinamento através das duas escalas descritas acima.

Microciclo 1 – Dois Jogos (terça e sábado)


Microciclo 2 – Um Jogo (sábado)


Discussão
Microciclo 1
1. Nota-se que o TRIMP da segunda-feira não alterou a recuperação da sessão de treino seguinte (jogo).
2. A PSR da quarta-feira diminuiu, em vista do estímulo considerável imposto pelo jogo de terça-feira.
3. Com a diminuição das cargas na quarta-feira foi possível obter um índice melhor de recuperação na quinta-feira.
4. A recuperação de sexta-feira foi sensível a um leve aumento das cargas na quinta-feira.
5. A diminuição das cargas na sexta-feira causou uma otimização da recuperação para o jogo de sábado.

Observações complementares
1. Notou-se que em direção ao final da semana o TRIMP dos atletas foi maior que o do preparador físico.
2. Isso pode mostrar que a comissão técnica pode subestimar o esforço realizado pelos atletas nas sessões seguintes, quando são realizados jogos no meio da semana.
3. O valor maior do TRIMP obtido pelos atletas pode também reportar uma recuperação física e psicológica insuficiente, com presença de micro lesões e dor muscular tardia.

Microciclo 2
1. As cargas elevadas de treino na segunda-feira e na terça-feira causaram diminuição da recuperação nos dias consecutivos.
2. Uma leve diminuição da carga na quarta-feira causou um índice melhor de recuperação na quinta-feira.
3. Uma grande diminuição do TRIMP na quinta-feira ocasionou uma melhor recuperação na sexta-feira.
4. A folga realizada na sexta-feira, sem qualquer estímulo de treinamento foi responsável por uma recuperação significante no dia do jogo (sábado).

Observações complementares
1. Os valores de TRIMP reportados pelos atletas foram próximos ao do preparador físico, exceto na sessão da quinta-feira.
2. As cargas altas de treino foram concentradas no início da semana, o que não influenciou o estado de recuperação ao final do microciclo.
3. A folga ou métodos de recuperação ativa podem otimizar a recuperação um dia antes dos jogos.

Essas informações são de autoria própria, devem ser utilizadas para fins de consulta e, portanto, não devem ser reproduzidas, nem divulgadas em qualquer meio de comunicação: impresso, digital e, principalmente, científico. Os integrantes do Blog agradecem.

Referências Bibliográficas
1. Foster C, Florhaug JA, Franklin J, Gottschall L, Hrovatin LA, Parker S, Doleshal P, Dodge C. A new approach to monitoring exercise training. J Strength Cond Research. 2001;15(1):109-15.
2. Coutts AJ, Rampinini E, Marcora SM, Castagna C, Impellizzeri FM. Heart rate and blood lactate correlates of perceived exertion during small-sided soccer games. J Sci Med Sports. 2007.
3. Impellizzeri FM, Rampinini E, Coutts AJ, Sassi A, Marcora SM. Use of RPE-based training load in soccer. Med Sci Sports Exerc. 2004 Jun;36(6):1042-7.
4. Alexiou H, Coutts AJ. A comparison of methods used for quantifying internal training load in women soccer players. Int J Sports Physiol Perform. 2008 Sep;3(3):320-30.

2 comentários:

Unknown disse...

Uma ferramenta muito boa para o controle da carga de treinamento por todos os fatores destacados no post. E comprovada com a aplicação na realidade de uma equipe que visa o alto nivel de desempenho de seus atletas, o que da uma credibilidade muito grande aos dados apresentados. Parabéns pela iniciativa Bruno!

Felipe Nunes Rabelo disse...

Parabéns Bruno! Muito relevante o post! Mais uma contribuição para entendermos melhor a prescrição e controle de treinamento.